Universo de Memórias

terça-feira, 18 de maio de 2010

Mãe, vestuário e aparência

Dona Alzira sempre foi uma pessoa vaidosa, investia na aparência com seus saltos de 10-12 centímetros e trajes muito bem escolhidos.
Dois anos pós partida do marido, a italianinha limitava-se a colocar uma saia preta e blusas brancas ou estampadas em preto e branco.
Os sapatos transformaram-se em pretos e de saltos bem mais baixos ou tamancos.
Depois desta observação, não me lembro ao certo a data, ela iniciou um processo diferente:vestia quase sempre a mesma roupa, já nem olhava atentamente para o que tinha dentro dos armários.
Eu cheguei a conversar sobre isto incentivando-a a separar por cores e que o luto havia acabado, mas na memória dela o luto seria eterno.
Recordo-me de vê-la vestindo roupas um pouco sujas e não as deixava lavar. 
Insistia e afirmava que estavam limpas.
Neste tempo passava a chave nos armários, eu não podia acessá-los. 
Só mais tarde consegui cópias das chaves e rapidamente pegava algumas e dá-lhe esfregar, secar e passar.
Então, eu colocava outra parecida no cabide e mamis não percebia.
Uma maratona.
Esquecia dos banhos e tomava dois, três.
Ainda bem porque depois veio a negação para banhos.
Esta é outra narrativa, para outra descrição.
Certa vez, quando estava por sair comigo e minha prima, abotoou um casaco de lã e errou a primeira casa. Claro que o casaco ficou torto e abaixo sobrou tecido.
Nós, tentando ajudá-la.
Virou-se para a sobrinha e disse:
-Eu dou um jeito.
Ela dirigiu-se ao quarto e voltou com a ponta do casaco cortada por uma tesoura.
Minha prima disfarçou, mas olhou para mim muito assustada.
Eu não disse uma palavra.
Pensei comigo mesma: minha mãe não está nada bem...
O mesmo fato ocorreu em outra situação com outro casaco. O mesmo proceder.
Escondi as tesouras. 
Em outros episódios esquecia de colocar as meias finas(não usava calças compridas), esquecia que tinha feito permanente(na época chamavam assim-encrespava os cabelos com aqueles bobies de alumínio).
Um adendo aqui.
Um salão que ela elegeu, na época, aproveitava-se da situação e fazia este procedimento químico uma vez por semana.
Tive que dar uma chega prá lá na funcionária e taxativamente dizer-lhe:
-Estou vendo!
-Daqui em diante você colocará um condicionador no lugar deste produto!
Esquecia se passava blush e dá-lhe novamente! Nem precisava dele porque sempre foi corada.
Eu limpava as maçãs do rosto dela e levava beliscões.
Confesso que não tinha muito tato nesta ocasião. Depois entendi e a distraía com outras conversas e retirava um pouquinho do blush. Nem sempre eu conseguia.
Esquecia que estava em lugares públicos e inocentemente abria o zíper da saia para pegar dinheiro da calcinha de lycra, também com zíper.
"Estas eu comprava e levava à costureira para que a profissional fizesse um compartimento interno onde os documentos plastificados deveriam ficar."
O tempo passando e mamis enchendo cada vez mais de coisas(algo direcionado só para identificação).
Uma preocupação constante.
Na verdade funcionou até ela acamar-se.
Enfim, ela não se enxergava mais e quando enxergava não via a pessoa que foi.

2 comentários:

  1. Oi lindona!! passando aqui para retribuir sua visita no meu BLOG 2012.

    Não tive oportunidade de agradecer no mesmo momento sobre sua maravilhosa contribuição quando participou de comentários por lá. Há pessoas que não gostam de manifestar suas idéias e muitas vezes visitam o BLOG, mas com muito medo...

    Adorei seu comentário! Vc é muito lucida em todas as questões, mesmo que não coadune com todos os pensamentos, tem sempre um belo comentário para acrescentar.

    Excelente o BLOG da D. Margarida. Imagem linda!
    Já adicionei o link desse BLOG no meu do Alzheimer (Windows Live). Tá logo no começo.

    bjo grande
    laura

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  2. Oi Laura, também atrasadinha em te responder por aqui. Vi o link e bem bacana você ter adotado e comentado. O texto do Blog 2012 é para refletir e gosto de respirar, parar, pensar, analisar. Este teu chamou minha atenção. Muitas leituras vindas por tua indicação foram valiosas.
    Beijokas!

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