Cientistas
de todo o mundo lutam para encontrar uma cura para a doença de
Alzheimer, muito temida, que cresce em ritmo acelerado em todo o mundo,
em consequência do aumento da expectativa de vida da população. Quanto
mais velha, maior o risco de uma pessoa sofrer dessa patologia que afeta
o cérebro, “apagando as recordações” e que condena o paciente, bem como
sua família, a uma deterioração devastadora e inevitável da qualidade
de vida.
Até hoje, a medicina conhece as causas desse tipo de demência, porém não
conseguiu descobrir a cura. As estatísticas indicam que aproximadamente
44 milhões de pessoas convivem com a demência em todo o mundo, número
que, segundo se estima, aumentará para cerca de 115 milhões até o ano
2050. Por isso, já se faz referência à Alzheimer como uma epidemia
mundial. No entanto, os avanços na pesquisa estão produzindo informações
novas e promissoras sobre a origem do problema e trazendo esperanças de
se poder detectar a doença em estágios mais precoces, como também
definir formas mais específicas de tratá-la.
Pesquisadores da Clínica Mayo, de Jacksonville, Flórida,
divulgaramrecentemente os resultados de um amplo estudo realizado em
centenas de genes, com mais de 700 amostras de tecidos cerebrais de
pacientes com a doença de Alzheimer ou outros distúrbios
neurodegenerativos. A médica Minerva Carrasquillo, uma das participantes
dessa pesquisa, explica o avanço da doença de Alzheimer e as novas
ferramentas para combatê-la à disposição da ciência. Acompanhe sua
entrevista:
Se a ciência já definiu que a doença de Alzheimer decorre de um acúmulo
no cérebro da proteína beta-amilóide e da proteína tau. Por que tem sido
tão difícil encontrar uma droga que cure e previna a doença – ou mesmo
uma vacina?
A evidência obtida até hoje indica que a patologia da doença de
Alzheimer se inicia com o acúmulo da proteína beta-amilóide, o que
resulta em uma cascata de eventos, que terminam com a destruição de
neurônios, em regiões do cérebro essenciais para a preservação da
memória e das funções cognitivas. Ainda que os tratamentos já
desenvolvidos para reduzir o acúmulo dessa proteína tenham apresentado
efeito colaterais, temos feito progresso nas tentativas de eliminá-los. A
maior dificuldade tem sido encontrar drogas que possam cruzar a
barreira hematoencefálica (barreira entre o sangue e o cérebro) e que
não produzam efeitos colaterais sérios. Porém, quanto mais aprendemos
sobre os fatores genéticos e ambientais, que aumentam o risco de
desenvolvimento da doença de Alzheimer, mais aumentamos o armamento para
combater essa doença.
Em que porcentagem a herança genética influencia na neurodegeneração, em
comparação com a idade avançada e com fatores ambientais de risco?
Estudos epidemiológicos que compararam a relação da Alzheimer entre
gêmeos idênticos (univitelinos) e gêmeos fraternos (bivitelinos)
estimaram que o componente genético dessa doença oscila entre 58% e 79%.
Portanto, não há dúvida de que os genes exercem um papel muito
importante no desenvolvimento da neurodegeneração. Porém, esses estudos
também demonstraram que os fatores ambientais contribuem em uma
percentagem significativa para o desenvolvimento da doença. Por isso,
devem ser estudados, a fim de se determinar se podem ser modificados a
ponto de diminuir, significativamente, os efeitos dos riscos genéticos.
Embora ainda não se tenha avaliada a porcentagem de risco oriundo
especificamente do envelhecimento, sabe-se que a idade avançada também
aumenta a deterioração do cérebro, o que, pelo que sabemos, intensifica
os efeitos adversos dos fatores genéticos que contribuem para o risco de
desenvolver a doença de Alzheimer. Por isso, o estudo de fatores que
influenciam na longevidade também pode contribuir para o desenvolvimento
de tratamentos para a doença de Alzheimer.
As pessoas que têm antecedentes familiares da doença de Alzheimer contam com alguma forma de prevenção de seu desenvolvimento?
Não. Ainda não se encontrou um tratamento para a prevenção do desenvolvimento dessa doença.
Atualmente, o mercado farmacêutico oferece medicamentos indicados para
retardar a progressão dessa doença, quando é diagnosticada. Quais têm
sido os resultados conseguidos com o uso desses medicamentos,
considerando seus altos custos?
Os medicamentos disponíveis atualmente apenas diminuem a progressão dos
sintomas e, infelizmente, o benefício é, com frequência, imperceptível.
Por isso, há tanta urgência em descobrir melhores tratamentos.
Qual a diferença entre o estudo recente da Clínica Mayo em comparação
com os estudos realizados anteriormente, tanto na Mayo como em outras
instituições?
Até há pouco tempo, a maioria dos estudos se concentravam em genes ou em
proteínas com funções relacionadas aos sintomas ou à patologia da
doença. Nos últimos cinco anos, estudos do genoma identificaram 20
variantes associadas ao risco do desenvolvimento da doença de Alzheimer.
No entanto, ainda não se sabe exatamente qual é a função dessas
variantes. Portanto, o enfoque de nosso estudo mais recente se concentra
em determinar se essas novas variantes causam mudanças na expressão
genética no cérebro.
Qual é o principal mérito dos resultados obtidos?
Graças ao grande número de amostras de tecido de autópsia cerebral que
foram doadas à Clínica Mayo para a pesquisa de doenças
neurodegenerativas, temos capacidade estatística suficiente para
detectar associações de variantes com níveis de expressão de genes
específicos. Os genes que demonstram ser modulados pelas variantes que
foram associadas ao risco de desenvolvimento da doença de Alzheimer
poderiam se converter em novos caminhos de intervenções terapêuticas.
De que maneira esse estudo contribui para a possibilidade de desenvolver terapias eficazes?
Nosso estudo está facilitando a identificação dos genes associados à
doença e nos guia para os mecanismos biológicos que contribuem para a
doença. O desenvolvimento de tratamentos eficazes depende do
conhecimento desses mecanismos biológicos.
Há alguma esperança a curto prazo?
Falar de cura tem sido muito difícil até agora. Porém, é preciso manter
sempre a esperança. Milhares de cientistas em todo o mundo trabalham
arduamente com esse objetivo em mente e, a cada dia, recebemos mais
informações que nos levam para mais próximos dessa meta.
Na recente Conferência Internacional de Copenhague (julho), foi feita
referência à relação entre a doença de Alzheimer e a perda do olfato.
Essa associação ajudará na detecção mais precoce do problema?
De acordo com os resultados desse estudo, a correlação entre a perda do
olfato e a doença de Alzheimer é significativa, porém não é perfeita.
Por isso, não se pode usá-la para predizer o desenvolvimento dessa
doença. Porém, conforme se especula, será possível utilizá-la em
combinação com os exames já existentes para se poder diagnosticar a
doença em pacientes, antes que eles apresentem todos os sintomas que até
agora têm sido usados para definir a doença, como, por exemplo, a perda
de memória episódica.
Em quanto tempo se poderá aplicar esse conhecimento à prática clínica? De que depende o desenvolvimento desses testes?
Ainda que o exame de odor, que foi utilizado nesses estudos, seja fácil
de aplicar e não é caro, é difícil prever quando se poderá utilizar esse
conhecimento, de fato, na prática clínica. Esses estudos ainda estão em
etapas iniciais e requerem confirmação em um grupo maior e independente
de pacientes.
Alguns estudos identificaram placas de beta-amilóide na retina de
pacientes afetados pela doença. Essa é uma descoberta realmente
promissora?
De uma forma similar aos estudos sobre a perda de olfato, os estudos que
visualizaram as placas de beta-amilóide no olho concluem que esses
exames poderiam ajudar a diagnosticar a doença de Alzheimer em idade
mais precoce, medir o progresso da doença e as respostas a terapias. De
acordo com os pesquisadores participantes do estudo que visualiza a
beta-amilóide no cristalino (a lente dos olhos), a correlação da
densidade de placas na lente com o diagnóstico clínico da doença de
Alzheimer é muito significativa. Porém, ainda são necessários novos
estudos para examinar essa correlação a longo prazo em indivíduos sem
demência, para determinar se, na realidade, esses exames podem ser
utilizados para diagnosticar a doença em idade mais precoce. Esse estudo
foi financiado, em parte, por verbas dos Institutos Nacionais de Saúde e
pelo Centro de Pesquisa da Doença da Alzheimer da Mayo. |
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